Uma joia eternizada em vinil: UNIVERSAL MUSIC lança em formato físico o premiado álbum “CÁSSIA ELLER E VICTOR BIGLIONE IN BLUES” (1992)
Um dos álbuns mais festejados pela crítica no ano passado, “Cássia Eller e Victor Biglione in Blues” chega este mês ao formato físico em LP. O disco, gravado em 1992 e lançado postumamente em 10 de dezembro de 2022, quando Cássia completaria 60 anos, recebeu em maio último o Prêmio da Música Brasileira na categoria “Projeto em Língua Estrangeira”. O trabalho é uma das pérolas do antigo acervo da Polygram, hoje sob a responsabilidade da Universal Music.
O lançamento físico de um álbum desta relevância eterniza o trabalho dos dois talentosos artistas. Saiba mais aqui:
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Fruto do encontro musical de uma das vozes mais marcantes da nossa música popular com o virtuosismo do renomado guitarrista Victor Biglione, o álbum era um dos discos mais aguardados dos últimos 30 anos. O trabalho reúne iluminadas releituras de clássicos do blues e do rock numa roupagem de rara criatividade em que o poderio vocal de Cássia Eller se casa perfeitamente com a sonoridade da guitarra de Biglione.
Depois do resgate dos originais do álbum, optou-se por uma remasterização para adequar o trabalho aos parâmetros técnicos de execução nas novas mídias, missão confiada ao premiado engenheiro de som Ricardo Garcia. “A qualidade da gravação feita na época é muito boa e os ajustes foram mínimos. É importante destacar que esse disco de 30 anos não é um trabalho datado. Sua sonoridade é contemporânea”, elogia.
Essa história começa após uma viagem do músico aos Estados Unidos no início de 1991. “Eu me ressentia que não tínhamos no Brasil um trabalho de releituras que expressasse a riqueza que a linguagem blues traz consigo”, conta o instrumentista e arranjador, que selecionou o repertório e buscava uma voz feminina que encarnasse o projeto. “Uma produtora amiga, Lígia Alcantarino, me indicou uma cantora iniciante chamada Cássia Eller. Ouvi Cássia cantando a faixa ‘Por Enquanto’, de Renato Russo, em que citava ‘I’ve Got a Feeling’, de Lennon e McCartney, na introdução. Logo vi que ela tinha essa pegada”, rebobina o guitarrista consagrado nacional e internacionalmente, que a essa altura já tinha três álbuns solo, um Grammy Internacional com o grupo Manhattan Transfer, em 1988, e já era um dos mais requisitados músicos de estúdio, o que o levou mais tarde a ser guitarrista com o maior número de gravações e shows na história da MPB.
Cássia, por sua vez, havia lançado seu primeiro álbum, “Cássia Eller” (Polygram, 1990), com um repertório dominado pelo rock’n’roll, e vinha arrancando elogios da crítica, pavimentando os primeiros passos de uma carreira apoteótica que lhe renderia inúmeras premiações, como o Grammy Latino, em 2002, os prêmios Sharp (1991, 1993, 1995, 1997, 1998 e 2002), Multishow (2002), entre outros.
“Lembro que a Cássia foi à minha casa bem tímida. Passei a ela o repertório e, três dias depois, no primeiro ensaio com a banda, ela já havia dominado todas as canções, com interpretações estonteantes e cheias de personalidade. Todos ficaram de queixo caído, pois ela não conhecia aquelas obras até então”, revela Biglione.
Espremido entre o primeiro e o segundo álbum de Cássia, “Malandragem” (Polygram, 1992), o projeto em parceria com Victor Biglione acabou não saindo. Mas o festejado encontro musical rendeu shows antológicos da dupla no Circo Voador e no Free Jazz Festival, de 1992, na noite em que tocariam Albert King e Robben Ford. Aliás, foi a lembrança dessas apresentações evocada pelo público que manteve a expectativa de lançamento desse álbum por tanto tempo. “Se o disco tivesse saído naquela época, certamente daria um impulso notável na carreira internacional da Cássia, que não deixava nada a dever a muitas cantoras estrangeiras”, aposta Biglione, músico com vasta vivência em festivais mundo afora, tendo conquistado posteriormente um Grammy Latino com Milton Nascimento por sua participação no acalmado álbum “Crooner”, em 2000, e foi finalista na edição de 2016 com o solo “Mercosul”.
“Cássia Eller é uma das maiores vozes femininas da história da música brasileira, além de ter sido uma referência de comportamento para muitos jovens que a acompanharam até a sua morte. Com uma carreira tão curta, deixou uma obra definitiva. Tudo é bom e a gente sempre quer mais. Os fãs de Cássia agradecem por essa iniciativa! Esse trabalho com Victor Biglione une esse desejo de ouvi-la de novo, e mais, com a certeza de que temos mais uma vez uma Cássia bem acompanhada, afinal, estamos falando de um dos maiores guitarristas do Brasil”, testemunha a jornalista a pesquisadora Chris Fuscaldo.
Composto por 10 faixas, sendo duas instrumentais, “Cássia Eller & Victor Biglione in Blues” reuniu no estúdio músicos de alta qualidade, recrutados por Biglione, que assinou os arranjos e dividiu a produção musical com o saxofonista Zé Nogueira. Participam da banda-base André Gomes (baixo elétrico), André Tandeta (bateria), Marcos Nimrichter (órgão), Ricardo Leão (teclados) e Nico Assumpção (baixo acústico), falecido precocemente em 2001, que toca em duas faixas. Biglione esbanja sua técnica por todo o trabalho travando diálogos inventivos com Cássia Eller. Há que se registrar ainda o arrepiante naipe de metais que reunia Zé Nogueira (sax alto e soprano), Zé Carlos Ramos, o Bigorna (sax alto), Chico Sá (sax tenor), Bidinho (trompete) e Serginho Trombone (trombone), morto em 2020. A captação, mixagem e masterização foram feitas na ocasião por Sérgio Murilo.
Texto acima por Affonso Nunes
Faixa a faixa, por Victor Biglione:
I’m Your Hoochie Coochie Man – A partir da interpretação inesquecível de Muddy Waters, fiz o arranjo elaborando mais alguns riffs bem primitivos e usei um naipe de metais com sax alto, sax tenor, trompete e trombone para apoiar uma interpretação gutural da Cássia Eller.
Got to Get You Into My Life – Neste arranjo, tive a alegria de unir à melodia de Paul McCartney uma guitarra lisérgica, partindo de uma adaptação do Blood, Sweat & Tears. Tudo foi completado pelo naipe de metais e pela voz vibrante da Cássia.
Same Old Blues – “Same Old Blues” reflete bem a ancestralidade do blues com sua pegada quase religiosa. Com o auxílio luxuoso do naipe de metais num arranjo especialíssimo, eu e Cássia entramos de cabeça nesse ritual mágico.
When Sunny Gets Blue – Esta melodia e harmonia sempre me fascinaram. Talvez seja o momento mais límpido do disco, com a excelência do baixo acústico do saudoso e genial Nico Assumpção. O sax do Zé Nogueira e a guitarra assumem uma linha tipicamente jazzística. E a Cássia entrega uma interpretação sedosa, elegante, à altura das grandes divas do gênero.
Blues Medley II – Este é um dos momentos instrumentais do álbum. Fazer um medley juntando “Oh, Well”, “Quadrant Four”, “Lazy” e alguns riffs de minha autoria foi uma experiência muito instigante porque, além de não perder o fio da meada, num andamento shuffle mais ligeiro, tive a oportunidade de mostrar vários tipos de fraseologia e sons da guitarra. E a banda-base formada por Ricardo Leão (órgão), Marcos Nimrichter (Rhodes), André Gomes (baixo) e André Tandeta (bateria) mandou bem demais.
If Six Was Nine – A morte precoce de Jimmy Hendrix abortou sua colaboração com Miles Davis, algo tão desejado pelo lendário trompetista. Neste arranjo, eu me permito arriscar sobre o que poderia vir a ser o resultado desse encontro de um monstro sagrado do rock com outro do jazz, unindo a intrincada sonoridade de Hendrix e o fraseado inconfundível de Miles. Cássia embarcou lindamente nessa viagem.
Prison Blues – Esta é uma homenagem minha e da Cássia ao Led Zeppelin e seu guitar hero, o inigualável Jimmy Page. Mostra o vigor de um power trio e encontra uma interpretação devastadora da Cássia. É uma autêntica cacetada! Cássia Eller em estado bruto.
I Ain’t Superstitious – Partindo do famoso riff do Jeff Back Group, utilizei o supertime de metais formado por Zé Nogueira (sax alto), Chico Sá (sax tenor), Bidinho (trompete) e o saudoso Serginho Trombone (trombone) para substituir o fraseado de algumas guitarras do Beck e toquei a guitarra slide para que Cássia completasse com muito vigor e agressividade na interpretação deste grande clássico de Willie Dixon.
I Ain’t Got Nothing But the Blues – Foi bastante desafiador juntar a conotação do blues rural dada por dois violões e o baixo acústico do inesquecível Nico Assumpção nesta harmonia riquíssima do grande mestre Duke Ellington. Comprovando toda sua categoria como intérprete, Cássia surge inspiradíssima nessa faixa imprimindo um timbre jazzy e classudo.
Blues Medley I – Para fechar o álbum, outro medley, que começa com a bonita melodia de “Need Your Love So Bad”, um clássico de Little Willie John que já mereceu muitas releituras. Esse clima vai crescendo com “You Shook Me”, do grande Willie Dixon, para terminar com “The Flash Door”, um tema de minha autoria, em fraseados de eletric bebop bem ágeis na guitarra.
Ficha Técnica – “Cássia Eller & Victor Biglione in Blues”:
Cássia Eller (voz)
Victor Biglione (guitarras, violões e arranjos)
Ricardo Leão (teclados)
Marcos Nimrichter (órgão)
André Gomes (baixo elétrico)
Nico Assumpção (baixo acústico)
André Tandeta (bateria)
Zé Nogueira (sax alto e soprano)
Chico Sá (sax tenor)
Zé Carlos Ramos (sax alto)
Bidinho (trompete)
Serginho Trombone (trombone)
Gravação e mixagem: Sérgio Murilo
Masterização: Ricardo Garcia
Produção musical: Victor Biglione e Zé Nogueira
Pós-produção: Affonso Nunes
Capa: Emerson Ferreira
Fotos: Paulo Ruy Barbosa
Estúdios Polygram: 1991/92
Com informações: www.universalmusic.com.br
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